“Os lábios muito vermelhos”, disse o candidato de direita à Presidência da República à candidata Marisa Matias. As redes sociais viram-se 'a braços' com uma corrente de solidariedade com a hashtag contra o machismo #VermelhoEmBelém a receber apoio até, da também candidata a Belém, Ana Gomes.
O estigma do batom vermelho, para além de encabeçar um problema que reside na sociedade desde que somos gente, o machismo, põe no centro da questão o preconceito que ainda há à volta da Beleza. Frívola, superficial e vazia, a Beleza, em especial a maquilhagem, é vítima diária de comentários depreciativos, na sua maioria de quem também defende pensamentos e atitudes que vão de encontro a uma visão machista, mas também preconceituosa, do mundo. Tenho-o visto e presenciado nos sempre 'críticos bancos de jardim', nas acesas trocas de mensagens no palco das redes sociais e nos becos das ruas e ruelas por onde caminho de passo em passo.
“Se for para usar assim maquilhagem, mais vale ir ao circo”... "Mulheres que usam maquilhagem são vadias”... “Um homem maquilhado? Que horror!”... alguns exemplos de comentários que vemos por aí e que inundam, à velocidade da luz, o nosso atarefado quotidiano.
No departamento da maquilhagem, continuamos amarrados aos ideais de outrora, ideais que, por vezes, ainda navegam entre nós: a mulher não pode usar o tal batom vermelho... só porque sim. "Porquê?”, questiono-me. Porque o batom vermelho, desde que conheceu a luz do dia, é símbolo não só de autodeterminação e sensualidade, como da luta feminista, vista por alguns como uma ameaça ao seu poder. E tudo o que possa colocar em questão a superioridade viril do homem, é um forte alvo a abater.
“Mas, afinal, e depois de todas as amarras impostas, não estará a maquilhagem a sair vitoriosa?”, continuo a questionar-me. Apesar dos comentários depreciativos que possa haver de quem não consegue ver para além da maquilhagem enquanto produto material, a conquista está a ser feita e a ganhar cada vez mais vozes, com uma parte do sexo masculino a adquirir sensibilidade para tal. Os astros musicais David Bowie, Harry Styles, Ozzy Osbourne e Steve Tyler lideram a mudança, estendendo a maquilhagem até à manicure, provando que ela não tem género. Aqui falo, também, das drag queens que usam e abusam de batons e sombras para seu bel-prazer. E a cultura punk? Sim, claro. Nos meios alternativos, a maquilhagem é uma das inquestionáveis protagonistas. Mas esta é outra história.
Com o mundo a ganhar uma outra dimensão nas redes sociais, a vitória da maquilhagem faz-se, também, por lá. Não é por acaso que James Charles é o influenciador de Beleza com mais sucesso do mundo, com um total de 26,2 milhões de seguidores no Instagram; e que a celebridade e it girl Kylie Jenner tem um império de maquilhagem sem precedentes, com milhões de euros a entrar, anualmente, na sua recheada conta bancária.
No que diz respeito à influência e reconhecimento, a icónica maquilhadora britânica Pat McGrath, conhecida pelo seu trabalho desde os anos 80, recebeu, no início deste ano de 2021, o título de ‘Dama’, concedido por Sua Majestade britânica.
Todos, em conjunto e em sintonia, trazem para o espaço público aquilo que a maquilhagem pode ser: criatividade, arte e poder. Através das texturas, traços e linhas, os sonhos e desejos ganham forma. Por intermédio da maquilhagem, sentimo-nos capazes de enfrentar o mundo, de sermos, simplesmente, nós. Como o maquilhador Du diz: “Maquilhagem é um espaço de liberdade.” Está tudo dito.
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