Este pensamento filosófico experimental desafia-nos a questionar os nossos conceitos de observação e perceção. Pode alguma coisa existir se não for percecionada conscientemente? A questão é também científica e a interseção com a cosmética faz-se cada vez mais. Podemos garantir o impacto dos cosméticos no nosso humor se não o conseguimos avaliar? É, de facto, bastante complicado, mas os estudos comprovam que os consumidores procuram cada vez mais marcas e produtos que assegurem benefícios emocionais.

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O aspeto hedonístico e o prazer de usar cosméticos, ou seja, o bem-estar e as melhorias psicológicas obtidas, são os verdadeiros motores do consumo. E, apesar de “entrar na cabeça” do consumidor não ser tarefa fácil, é absolutamente necessário para esta indústria, o que pode explicar a taxa de crescimento anual prevista de 18,7% até 2030, para o mercado global de deteção de emoções, com a Inteligência Artificial a servir de catalisadora.

O fator “bem-estar” na cosmética vai muito além do facto de o consumidor gostar ou não gostar de um produto. É acerca da emoção sentida e a avaliação desse efeito na pessoa. O efeito anti-stress e a melhoria do humor tornaram-se, desde o início da pandemia, mais importantes, relembrando os tempos históricos da Segunda Guerra Mundial, quando o batom vermelho foi considerado por Winston Churchill um bem de primeira necessidade apenas por aumentar o moral.

A pele é tanto um órgão sensorial como de comunicação; um envelope físico e emocional, que manifesta ao mundo exterior o estado interno de saúde e de bem-estar. O eixo de ligação pele-cérebro tem sido analisado na psicodermatologia, e muitos estudos sugerem até uma reciprocidade, ou seja, uma saúde mental débil afeta negativamente a saúde da pele, e vice-versa.

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Um estudo publicado em 2022 no Journal of the European Academy of Dermatology and Venereology provou que a aplicação de um creme emoliente no corpo diminui a progressão da disfunção cognitiva em pessoas com idade superior a 65 anos. Há muito que se conhece o impacto positivo dos cosméticos na saúde mental, não só pelo impulso que dão à autoestima, mas também no conforto funcional que asseguram. Neste estudo faz-se a associação entre a disfunção cognitiva e a inflamação, neste caso, da pele. Do ponto de vista regulamentar, comunicar todas estas propriedades para um cosmético é um enorme desafio, pois não se podem fazer alegações relativamente aos cosméticos que possam, de alguma forma, ser confundidas como terapêuticas.

Referido como "Vitamina T", também o toque, aquando da aplicação dos cosméticos, melhora o humor e evoca emoções positivas. Com ele, estimulam-se as fibras C e outras terminações nervosas associadas ao prazer. A conceção “à medida” de produtos ou protocolos de cuidado da pele, com técnicas de aplicação personalizadas, é também suscetível de reconfortar o ser humano.

Sabe-se que a massagem física pode aumentar os níveis de oxitocina e a atividade neurológica em regiões cerebrais associadas à recompensa, bem como à sensação de prazer e bem-estar. As provas neurofisiológicas indicam que a ativação das fibras C tácteis pode reduzir a dor e os sintomas de depressão. A oxitocina inibe ainda protetivamente a senescência dos fibroblastos humanos, que está ligada à libertação de citocinas pró-inflamatórias e contribui para o envelhecimento da pele. Todos estes dados introduzem o tato, a textura e o perfume, como aspetos muito importantes para a consideração positiva associada ao autocuidado. A forma como isto acontece está longe de ser plenamente conhecida, mas falamos de “Ciência com humanidade”.

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Voltando à árvore na floresta, e à questão sobre se alguma coisa existe se não for percecionada: é muito importante referir que os cosméticos não são usados num ambiente “estéril” e os inputs surgem de múltiplas formas, tais como através da embalagem ou do branding. Se uma experiência emocional não é percecionada pelo consumidor, o que significa isto em termos de eficácia de um cosmético? Como se definem as emoções e de que forma as podemos avaliar? O que significa “feliz” e quanto é que é necessário mudar para deduzir que houve um aumento no estado de ser “feliz” por estar a usar um produto cosmético? Como é que podemos provar que ficamos mais felizes por aplicar um batom vermelho nos lábios?

Não tendo respostas concretas para tudo isto, mas com os dados conhecidos até à data, pode-se afirmar que a aplicação ritualística de cuidados cosméticos, com massagem, feita pela própria pessoa ou por outra, resulta num momento positivo para a nossa saúde física e mental, com elevada probabilidade de nos aumentar a sensação de bem-estar e melhorar o humor. Portanto, não há qualquer dúvida em recomendar que o façam. Todo este investimento será recompensado no futuro com uma melhor pele e, acima de tudo, com uma pele na qual nos sintamos mais confortáveis e felizes.

Farmacêutica de formação e especialista em Cosmética, Joana Nobre trabalha na Indústria Farmacêutica desde 2005. O rigor é a sua imagem de marca, algo bem patente nesta nova rubrica que criou para a Miranda, que incluirá sempre a versão áudio do texto.

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