versão audio

O envelhecimento digital decorre da emissão de radiação de luz visível azul na pele. Atualmente é consensual: a pele envelhece mais depressa, e algumas patologias agravam-se, por estarmos cada vez mais horas em frente aos nossos dispositivos eletrónicos.

O que é a luz azul?

A luz azul é uma radiação no espectro da luz visível, com cor, que pode ser vista pelo olho humano. Imediatamente a seguir à radiação ultravioleta, é a luz no espectro visível que apresenta maior energia, sendo capaz de penetrar muito profundamente na pele, até ao tecido adiposo subcutâneo.

Emitida pelo Sol na sua forma natural, a luz azul não existe isolada, ou seja, está sempre acompanhada de outras radiações, o que garante um certo equilíbrio, e o corpo humano usa-a para regular os seus ciclos naturais de sono e vigília, no chamado ritmo circadiano.

Os ecrãs fazem parte da nossa vida

De acordo com estudos recentes, o tempo passado ao telemóvel pelos millennials representa um dia por semana. O uso de dispositivos eletrónicos, emissores de luz azul, está a crescer em todas a gerações: 60% das pessoas passam atualmente mais de seis horas do dia em frente a um ecrã de computador ou outros dispositivos móveis. Durante o período de confinamento, com o teletrabalho e a permanência de longos períodos em casa, houve um aumento do uso de tecnologias emissoras de luz azul e prevê-se que esta tendência permaneça no futuro.

Como fontes artificiais de luz azul, incluem-se os dispositivos eletrónicos, como smartphones, laptops e outros computadores, tablets, televisores, mas também as lâmpadas fluorescentes de baixo consumo de energia e as luzes LED.

Todas estas fontes emitem luz azul isolada — maioritariamente no comprimento de onda entre os 435 e os 455 nanometros (nm) — e causam o envelhecimento digital.

O lado negro da luz azul

A pele é o nosso maior órgão e tem uma função de barreira que é essencial à nossa sobrevivência, sendo a primeira linha de defesa contra agressões ambientais. Durante o dia, concentra-se na proteção, enquanto à noite repara os danos do dia que passou, preparando-se também para o dia seguinte.

Este ciclo de 24 horas é regulado e sincronizado por genes presentes em todas as células cutâneas. O cumprimento dos timings de exposição — e de não exposição — à luz é essencial para a saúde da pele.

A exposição noturna a luz azul artificial restringe a produção de melatonina, hormona que controla o ciclo de sono e que é essencial na reparação celular. Além disso, “confunde” diretamente as células da pele, fazendo-as crer que é de dia. Como tal, durante essa exposição, as células não se reparam, causando danos e acelerando o seu envelhecimento. As proteínas fotorrecetoras da pele e da retina saturam, deixando de ser capazes de absorver a luz azul, formando-se radicais livres.

Na epiderme, os radicais livres alteram os queratinócitos e, consequentemente, a barreira cutânea, causam hiperpigmentação e alterações de cor.

Na derme, afetam os fibroblastos, reduzindo as sínteses de colagénio e de fibrilina, componente das fibras de elastina, o que dará origem a rugas e flacidez, bem como a um aumento no tempo de cicatrização. Causam ainda vasodilatação, com consequente vermelhidão.

A dose faz o veneno, já dizia Paracelso

Deixe-se irradiar por esta playlist em tons de azul.

alguns benefícios decorrentes da exposição controlada da pele à luz azul, nomeadamente no tratamento da acne, da psoríase, da dermatite atópica, do eczema, de algumas neurodermatites e até da depressão. A luz azul natural ajuda a regular o ritmo circadiano, potencia o estado de alerta, ajuda na memória e função cognitiva, e dá ânimo.

Quem precisa de proteção contra o envelhecimento digital?

Todos nós precisamos de tomar precauções contra os efeitos da luz azul, porque passamos muitas horas, diariamente, em frente a ecrãs.

O que fazer então?

Usar software que filtre a luz azul. A maior parte dos sistemas operativos de PCs e smartphones já incluem esta funcionalidade. Não use apenas à noite, mantenha-os sempre ativos.

Usar óculos com lentes que filtrem a luz azul. Esta será uma proteção valiosa para a pele do contorno de olhos.

Usar cosméticos que promovam esta proteção específica:

  • Protetores solares: há alguns protetores no mercado que, para além da proteção contra a radiação ultravioleta, garantem ainda uma proteção contra a luz visível de alta energia, ou seja, contra a luz azul. Destacam-se aqui os filtros físicos, como o óxido de zinco e o dióxido de titânio, e ainda ingredientes como a melanina fracionada.
  • Séruns e Cremes com ingredientes antioxidantes: cacau, carotenoides, extrato de esteva, de folha de argão, de fruto da gardénia, vitamina C, niacinamida, retinol, ácido ferúlico; ou ingredientes que ressincronizam o ritmo circadiano: alguns péptidos biomiméticos e o extrato de flores de açafrão.

Limpar muito bem a pele de manhã e à noite, e fazer uma esfoliação semanal. Estas duas ações ajudam na eliminação de poluentes exógenos que oxidam a pele.

E, claro, sair de casa. A luz solar tem o balanço perfeito do espectro e dá-nos, no tempo certo, tudo o que precisamos. Opte pela luz natural sempre que possível.

Lembre-se ainda que, para a sua pele, os cuidados de proteção contra a luz azul farão parte de uma abordagem global de cuidados, que passam pelos cosméticos, a nutrição e o exercício físico.

Farmacêutica de formação e especialista em Cosmética, Joana Nobre trabalha na Indústria Farmacêutica desde 2005. O rigor é a sua imagem de marca, algo bem patente nesta nova rubrica que criou para a Miranda, que incluirá sempre a versão áudio do texto e uma playlist de Spotify criada também por ela, alusiva com o tema.
Para a realização deste artigo, foram consultadas diversas fontes bibliográficas:
  1. Global Cosmetic Industry® The Beauty Innovator’s Resource, Skin Care 2021, March 2021.
  2. Dong, K. et al, Blue light disrupts the circadian rhythm and create damage in skin cells, International Journal of Cosmetic Science, 41, 558-562 (2019)
  3. Arjmandi, N. et al, Can light emmited from smartphone screens and taking selfies cause premature aging and wrinkles?, Journal of Biomedical & Physics Engineering, 8(4) : 447-452 (2018)
  4. Regazzetti, Claire et al Melanocytes sense blue light and regulate pigmentation through Opsin-3, Journal of Investigative Dermatology 138, 171-178 (2018)
  5. Vandersee, Staffan et al, Bue-violet light irradiation dose dependently decreases carotenoids in human skin, which indicates teh generation of free radicals, Hindawi Publishing Corporation, Oxidative Medicine and Cellular Longevity Volume 2015, Article ID 579675