Definitivamente, a Indústria da Beleza está feita só para as mulheres. Tenho tentado, por diversas vezes, furar esse sistema, mas sou imediatamente cuspido. Às vezes, ainda chego a ser mastigado mas, regra geral, fico sempre preso numa película mucosa pela qual escorrego lentamente, até que caio no chão, levanto-me e venho de mãos a abanar. Sou só eu que sinto embaraço quando entro numa Sephora? Sou só eu que quando vejo mais de dois cremes para a mesma finalidade, fico confuso? E por que é tudo tão caro, capaz de custar os olhos da cara? Sendo que os olhos da cara já estão em declínio...
Num mundo extremamente competitivo, o aspecto da pele influencia muito a percepção que os outros têm de nós. E se os cremes e a maquilhagem nos ajudam a ter um ar mais saudável e confiante, então é meio caminho andado para o sucesso. É por isto que um homem está disposto a cuidar da sua pele, apesar de todos os dias ser confrontado com um mercado que o inibe de comprar neste mercado.

Somos práticos e minimalistas

Caros directores de comunicação e marketing dos cremes e da maquilhagem para homens, este é o meu plano de comunicação para conquistar o público masculino, criando todo um cenário apetecível, com todas as condições atmosféricas de excelência, que culminará na compra do tão desejado produto. Nós, homens, somos práticos e minimalistas.
Não vamos passar horas na internet e nas lojas a descobrir novidades e a querer experimentar tudo. Só queremos um creme que faça o que tem de fazer: resolver o problema x, y ou z e não perder tempo com isso. Não somos deslumbrados pela ideia de nos cuidarmos e mimarmos, como as mulheres. O que nos deslumbra é a ciência do produto. A ideia de encontrar um creme no supermercado é óptima. Os primeiros cremes que comprei foi no Lidl e contribuiu para isso o facto de os poder adquirir num local de frequência habitual, mas sobretudo o preço.

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Mesmo assim, se ao meu lado está uma mulher a ver os mesmos cremes para comprar, já me sinto inibido. É como se estivesse a invadir um território que não me pertence. Esqueçam essa ideia de que são as mulheres que compram para os namorados, porque nós já estamos emancipados e já fazemos estas coisas sozinhos. Por isso, o ideal seria encontrar estes cremes ao pé das escovas e das pastas dentífricas, dos desodorizantes... mas longe dos cremes das mulheres. Mesmo que compremos o mesmo creme, estamos a fazê-lo por razões diferentes.

Às compras onde nos sentimos mais confortáveis

Mais confortável é entrar numa farmácia e poder apreciar as prateleiras dos produtos dermatológicos. Todos pensados para resolver problemas de pele específicos, mas a conviverem muito bem ao lado de outros que nos resolvem a boa aparência. Na Wells, então, pode-se viver bem esta experiência, já que as prateleiras são completamente acessíveis aos clientes. Não há qualquer embaraço em ficar ali a descobrir o que a ciência cozinhou para nós.
Não sou frequentador de barbearias, mas se querem homens a comprar cremes de homens, criem um ponto de venda numa barbearia. Ponham o creme no menu, façam formação de produto ao barbeiro e ensinem-no a aplicar o creme e a fazer o discurso comercial básico. Ofereçam uma amostra, apliquem essa amostra. Façam conversa sobre boa aparência, sobe um ar saudável e sobre fechar negócios. Ou sobre bom aspecto, confiança e raparigas.

Também podem falar de futebol e o cliente vai acabar a descobrir que os grandes futebolistas que admira também se cuidam da mesma maneira e que provavelmente até usam esse creme que acabou de passar no rosto. Não conseguimos abrir uma barbearia dentro da Sephora, pois não? Ou talvez o melhor seja abrir uma Sephora dentro de uma barbearia...

Definitivamente, precisamos de um território nosso no que diz respeito a beleza. Se trocassem os empregados da Sephora pelos empregados da Foot Locker, tenho a certeza que haveria muitos mais homens a comprar cremes de beleza. Na vida, é tudo uma questão de arquétipos e tenho a certeza de que um discurso Foot Locker aplicado ao mundo dos cremes iria finalmente distinguir o território masculino do feminino.

E então a maquilhagem?

Debruço-me sobre cremes, mas poderia também estar aqui a escrever sobre maquilhagem. No que diz respeito a esta ciência, um homem só quer ter uma pele uniforme, sem imperfeições e que ao mesmo tempo aparente não ter posto nada. Pode fazer a diferença no campo profissional, em entrevistas de trabalho e em dias de eventos especiais. Neste campo, já precisamos de um reforço no arquétipo e trazer influencers ao barulho. Se esses influencers forem da área da televisão e da moda, irão abordar a maquilhagem de uma forma muito natural, já que a usam todos os dias para trabalhar.
Escolham o José Fidalgo ou o Paulo Pires para serem embaixadores desta utópica marca de maquilhagem masculina. Haverá algum desportista que também desse a cara por essa marca? Em boa verdade, nem fazemos muita questão na distinção da linha feminina e masculina. Mas os olhos também comem, e às vezes vomitam.

Pode estar tudo alinhado para chegarmos ao momento de agarrar o produto, até que nos deparamos com ele e todo o design é frufru até dar dores de cabeça. Não estou a dizer para criarem o Kit de Maquilhagem do Batman ou do Wolverine, mas será possível construírem um packaging mais neutro e minimalista? É que assim até começava a comprar maquilhagem... Claro que aconselhado pelo empregado da Foot Locker ou pelo barbeiro da Figaro’s, aquela barbearia lisboeta onde parece que não deixam entrar mulheres. O karma é uma coisa lixada!...

Bruno Reis, colaborador da Miranda, é o fundador e director criativo da Teeorema, marca de luxo de t-shirts.