Apesar da sua forte ligação ao Hinduísmo, o Yoga não é nem pertence a qualquer religião específica. É essencialmente uma disciplina espiritual, uma forma de estar na vida, um caminho para harmonizar corpo, mente e espírito, e ultrapassar os sofrimentos causados pela ilusão da separação da Consciência Individual (Atman) da Consciência Universal (Brahman).
Grande parte das artes tradicionais indianas são representações de mitos e símbolos. São contos fabulosos, que relatam eventos do passado, elevando-os a um significado maior. Estando os asanas do yoga profundamente enraizados na cultura indiana, acabam por beneficiar desta conexão com o sagrado.
Os mitos e simbologias por trás dos asanas têm muito a ensinar-nos, e perceber a história por trás de uma postura ajuda-nos a melhor perceber os benefícios da conexão mental e espiritual com as sensações físicas. Por outras palavras, ajuda-nos a ir além da “performance” física, simplesmente pelo facto de percebermos o seu significado.
Muitas das histórias de asanas revelam o lado mais humano de Deuses, as suas incertezas, falhas e fracassos. E, isso, tornam possível a identificação com os desafios reais da vida.
O Guerreiro (Virabhadrasana), nas suas variações I, II ou III, está sempre presente nas minhas práticas, e lembro-me frequentemente da história deste asana quando estou na postura. Vamos então a ela!
Diz-se que Lord Virabhadra é a forma feroz de Lord Shiva que, como sabemos, é conhecido pela sua fúria. Uma dessas narrativas surge quando a sua raiva surge por amor à sua esposa, Sati. Filha do rei Daksha, Sati casa com Lord Shiva sem o consentimento do pai. Em virtude disso, acabam por não ser convidados para um evento particular, organizado pelo rei, mas mesmo assim Sati comparece ao evento, apesar de Lord Shiva lhe pedir para não o fazer.
Confrontando o pai sobre o facto de ela e o seu marido não terem sido convidados para o evento, a resposta do rei deixa Sati perturbada. Desapontada e enraivecida, Sati atira-se ao fogo. Ao saber do sucedido, e em total raiva, Lord Shiva arranca os seus “dreadlocks”, dos quais surge a sua outra forma: um guerreiro chamado Virabhadra. Com o consentimento de Shiva, Virabhadra destrói o evento e decapita o rei Daksha, o que gera medo em todos os outros deuses que haviam sido convidados para o evento, levando-os a abandonar o mesmo. Perante o sucedido, e mediante pedido de Lord Vishnu (Lord Brahma), Lord Shiva consegue acalmar a sua fúria e devolve a vida ao rei.
Desta lenda nasceu a postura Virabhadrasana, representando o espírito de um guerreiro feroz que está preparado para oferecer a sua vida por uma missão divina. Virabhadrasana requer foco e devoção. Um foco unidirecionado, mesmo quando a consciência possa estar mais dispersa.
Esta narrativa mostra-nos também como é natural cometer erros em resposta a emoções humanas negativas (como a raiva, o ciúme, a inveja …), mesmo quando estamos num caminho mais espiritual. E é aqui que o Yoga nos ensina a importância de sairmos deste tipo de situações mais descontroladas. Tal como Shiva conseguiu controlar a sua raiva e resolver os seus conflitos com o rei Daksha, o poder e a autoconfiança alcançados com a prática de Virabhadrasana não deve impedir-nos de cultivar a humildade.
Assim, tal como quando praticamos Virabhadrasana I, II ou III, podemos lembrar-nos de situações em que a nossa vida se possa tornar mais descontrolada, o Yoga está lá para nos ajudar a seguir o caminho do perdão e da compaixão. No tapete, vamos sentir-nos guerreiras e a cada nova respiração encontramos uma sensação de coragem e poder. Fora do tapete, aprendemos a ser humildes e fortes, sendo verdadeiras connosco mesmas.
A posição do guerreiro ajuda-nos a melhorar o nosso equilíbrio, foco e estabilidade.
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