#CrèmeDeLaCrème: cosméticos – com ou sem perfume?

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Um perfume é uma mistura química que tem cheiro ou odor, mas é muito mais do que isso, porque engloba valor cultural, histórico, social, económico e emocional.
#CrèmeDeLaCrème: cosméticos – com ou sem perfume?

Existem vários motivos para os cosméticos terem fragrâncias. O perfume, nas fórmulas, serve para conferir um odor agradável, mascarar o cheiro inerente de alguns ingredientes da formulação – que muitas vezes não é agradável – e, ainda, melhorar a experiência de uso do produto pelo consumidor. Os perfumes conferem benefícios importantes, que são tangíveis ou intangíveis, mas sempre valorizados – por exemplo, resolver problemas funcionais importantes e satisfazer necessidades emocionais valorizadas.

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Vários estudos confirmam que as fragrâncias aumentam o bem-estar e têm um impacto positivo na psique, estimulam o nosso cérebro e criam uma ligação emocional com um produto, aumentando a perceção de valor e permitindo um melhor reconhecimento da marca. Os estudos mais recentes de marketing olfativo e de consumo indicam que a fragrância é um fator-chave que afeta a preferência do consumidor por um determinado produto cosmético. Isso deve-se ao facto de o olfato estar diretamente relacionado com o sistema límbico do cérebro, onde a memória e as emoções são armazenadas.

Embora nem todas as marcas tenham uma forte assinatura olfativa, as diferentes gamas de cuidados com a pele são, por outro lado, muito identificáveis ​​graças à sua fragrância. A fragrância nos produtos ajuda a criar uma memória em relação ao produto ou, até, à marca: o exemplo clássico do creme Nivea.

Uma fragrância agradável favorece também a aplicação dos produtos, o que é essencial para conseguirmos ver os resultados a médio ou longo termo dos produtos. Os dermatologistas salientam isso em relação às gamas antiacne destinadas aos adolescentes, por exemplo.

O cheiro do produto comunica várias emoções: o aroma dos citrinos é energizante; o aroma da lavanda é relaxante. Para a maioria dos consumidores, os produtos de beleza perfumados fazem parte da experiência de bem-estar e de luxo, e impactam as decisões de compra. Basta pensarmos na frequência com que abrimos e cheiramos um produto antes de o comprar, algo que só devemos fazer nas unidades que servem de tester, porque sempre que abrimos um cosmético na prateleira para cheirá-lo, estamos a diminuir o seu período após- abertura.

#CrèmeDeLaCrème: cosméticos – a dose ideal
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As substâncias perfumadas são compostos orgânicos de origem natural – óleos essenciais, extratos, outros óleos – ou sintética, com um cheiro característico, geralmente agradável (apesar do seu caráter sempre subjetivo), que conferem um aroma a um determinado produto cosmético. Uma fórmula de perfume pode conter até várias centenas, ou mais, de ingredientes diferentes. No rótulo de um produto cosmético, são normalmente indicados pelo termo universal "parfum". Alguns produtos rotulados como sendo “sem perfume” podem conter moléculas odoríficas ou geradoras de notas olfativas; simplesmente não têm perfume adicionado.

Devido ao potencial alergizante ou até mutagénico de algumas fragrâncias ou moléculas odoríficas, foi determinado pela União Europeia em 2009, de acordo com a legislação em vigor, restringir a utilização de algumas dezenas de alergenos que compõem determinadas notas olfativas. Quando as concentrações destas substâncias são superiores a 0,001% nos produtos não enxaguados, e 0,01% nos produtos enxaguados, é obrigatório que o seu nome esteja presente na lista de ingredientes. Como exemplos, podem listar-se: benzyl alcohol, citral, citronellol, eugenol, linalool e limonene.

É muito importante reforçar que as substâncias perfumadas naturais não são melhores do que as sintéticas. Alguns dos compostos químicos aromáticos naturais estão listados como sendo fortemente alergizantes. É essencial que se perceba que os óleos essenciais (muito usados em fórmulas vendidas como não contendo perfume), são fortemente perfumados e têm diversas substâncias que podem ser nocivas para as peles mais sensíveis ou reativas, devendo ser evitados nos cuidados para pele oncológica, da grávida ou infantil.

Outro aspeto importante é o facto de estes componentes naturais sofrerem mais facilmente oxidação e, por isso, há maior necessidade de colocar mais conservantes na fórmula para não afetar a sua estabilidade.  Há ainda outro aspeto importante: do ponto de vista da sustentabilidade, os óleos essenciais não são uma boa opção e, no entanto, muitas marcas usam-nos para greenwashing, levando o consumidor a pensar o contrário. As substâncias naturais são também, muitas vezes, fotossensibilizantes.

Os cosméticos sem perfume são melhores que os outros?

Não necessariamente. Segundo o Scientific Committee on Consumer Safety, as fragrâncias são consideradas a principal causa de reações alérgicas na pele, afetando cerca de 1-3% da população geral, mas o perfume é apenas um dos ingredientes da fórmula do cosmético, e a sua presença ou ausência não faz dele bom ou mau. Há muitas outras coisas a analisar.

#CrèmeDeLaCrème: perfume – truques para escolher e fixar um aroma todo o dia
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Um relatório do 'American Journal of Clinical Dermatology' mostra que 1,7% a 4,1% da população em geral é sensível a misturas de fragrâncias em produtos cosméticos. As fragrâncias podem ser também um grande gatilho para enxaquecas, especialmente em produtos faciais. A sensibilidade não é igual em todo o corpo. O rosto é normalmente mais suscetível a reagir às substâncias perfumadas. Por isso, se temos pele sensível, podemos evitar produtos perfumados no rosto, mas talvez usar no corpo, se isso nos aumentar o bem-estar e promover a utilização mais regular dos produtos. O mesmo para os produtos com ou sem enxaguamento, como o gel de banho, sabonete ou champô. Os primeiros, que removemos com água, têm muito menos tempo de contacto com a pele e, por isso, oferecem muito menos risco de alergia ou sensibilidade.

Os cuidados com a pele são uma escolha pessoal e a preocupação de cada consumidor deve ser respeitada, mas a legislação atual garante-nos que as fragrâncias são seguras.

Farmacêutica de formação e especialista em Cosmética, Joana Nobre trabalha na Indústria Farmacêutica desde 2005. O rigor é a sua imagem de marca, algo bem patente nesta nova rubrica que criou para a Miranda, que incluirá sempre a versão áudio do texto.

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