Atualmente, assistimos ao fenómeno preocupante da utilização indevida e excessiva de cosméticos com ação anti-envelhecimento por parte deste grupo de consumidores - a designada geração Alfa - um fenómeno já descrito como “cosmeticorexia”.

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O que é uma criança? O que pode ou não usar nos seus cosméticos? Há ou não ingredientes proibidos? Como se constrói a rotina ideal para uma pele infantil?

A Organização Mundial da Saúde define criança como o indivíduo de idade menor que 18 anos. A geração Alfa compreende todas as crianças nascidas depois de 2010 e são consideradas pela indústria cosmética como a sua nova oportunidade. Mas, também, a sua maior responsabilidade. Esta geração é ainda mais apaixonada pela cosmética do que a geração Z (os seus irmãos mais velhos) ou os millenials (os seus pais), mas precisa muito de educação sobre a saúde da pele e na forma como encaram o envelhecimento, o positive ageing.

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Sessenta e seis por cento dos consumidores de beleza com idades entre 12-14 anos usa as redes sociais para descobrir novas marcas de cosméticos e novos produtos (dados Mintel, março 2024). Estas crianças aprendem com os influenciadores no TikTok ou no Instagram, e com as suas reviews, mas não com as marcas ou com os especialistas na área. E isto é preocupante: 55% das crianças com idades entre 6-16 anos afirmam querer comprar os produtos apresentados pelos seus influenciadores favoritos nestas duas redes sociais (fonte WPP: Wunderman Thompson).

Quais são as suas motivações e o que os fascina nos cosméticos que escolhem usar?

Os estudos revelam que estas crianças não estão propriamente à procura de produtos anti-envelhecimento. Elas querem embalagens bonitas e coloridas, como são exemplo as das marcas Drunk Elephant, Byoma, Laneige ou Sol de Janeiro. Muitas marcas e pontos de venda, incluindo cadeias relevantes de farmácias, têm adotado medidas para tentar impor algum controlo que limite o consumo incorreto de produtos nestas faixas etárias.

A Dove tem sido uma das marcas mais ativas na literacia desta geração, comunicando os perigos do uso de determinados ingredientes numa pele ainda tão frágil, e criou, juntamente com especialistas em pele e saúde mental, o movimento “The Gen A Anti-Ageing Talk” com a hashtag #TheFaceof10 que podemos encontrar afixado na sua conta de TikTok.

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Apesar de nestas faixas etárias termos uma amplitude muito grande de tipos de pele e necessidades, não estaremos errados ao afirmar que as crianças têm uma pele mais frágil e, acima de tudo, sem necessidade de ingredientes anti-envelhecimento. Contudo, não podemos dizer que ingredientes como os retinóides ou os hidroxiácidos sejam desajustados, porque poderão não ser. Por exemplo, se forem usados em cosméticos para a acne, fazem todo o sentido. Não havendo esta patologia, a rotina deverá ser simples e conter apenas o essencial para o bom funcionamento da função barreira da pele: limpeza suave, hidratação e fotoproteção. Daí a importância de procurar a ajuda de um médico ou farmacêutico, para um aconselhamento adequado e ético. Do ponto de vista da saúde mental, caso se note uma preocupação excessiva com a imagem, a obsessão com a perfeição ou o medo de envelhecer, os psicólogos poderão, também, ajudar.

A motivação de contrariar o envelhecimento em idades tão jovens não deverá ser encarada como algo razoável, porque não é. De onde vem este medo em envelhecer? Quem passa esta mensagem a estas crianças? A cosmética serve para alavancar a nossa auto-estima, mas isto vai muito além do envelhecimento. E, não tendo a criança maturidade para compreender o impacto nocivo do consumo desajustado na sua saúde da pele em geral, compete aos adultos à sua volta assegurarem isso mesmo e corrigirem os seus próprios hábitos, se necessário. De resto, o autocuidado é muito importante em qualquer idade e poderá até promover momentos salutares entre estas crianças e os seus familiares mais velhos.

Factos: a aplicação dos cosméticos adequados assegura a saúde da pele nas crianças e evita doenças. Do ponto de vista emocional, está provado cientificamente que a maquilhagem tem o poder de promover a imaginação; os produtos de higiene ou os hidratantes, quando massajados, dão conforto e aliviam o stress; os perfumes aumentam a confiança na interação com os outros… são muitos os aspetos positivos do uso de cosméticos desde a infância, mas, como em tudo na vida, “com conta, peso e medida”.

Farmacêutica de formação e especialista em Cosmética, Joana Nobre trabalha na Indústria Farmacêutica desde 2005. O rigor é a sua imagem de marca, algo bem patente nesta rubrica que criou para a Miranda.