Estava à mesa com o Matias, o filho de um grande amigo, que se andava a portar mal na escola e, depois da inevitável chamada de atenção destes dois adultos chatos, para aligeirar o ar carregado, acrescentei: Podes portar-te mal. Faz as travessuras todas que quiseres. Mas ao menos, vai bem vestido e faz tudo em grande estilo. Ele riu-se!
O Matias nasceu bonito e cresceu bonito. Nariz pequeno e bem feito, lábios apetitosos, olhos castanhos grandes e bem desenhados e um cabelo castanho aloirado ondulado. Tem 12 anos e já causa sensação entre o público feminino, na escola e nos vários grupos que frequenta. Se ele cometesse um pequeno delito, vocês perdoariam, não perdoariam? Tenho a certeza que sim. Também apostaria que perdoariam um delito maior, mas não vamos incentivar o rapaz!
Desde sempre que acho que Beleza e Perdão andam de mãos dadas e que quem nasceu com o dom da Beleza terá sempre o mundo a seus pés: Beleza, Perdão e Poder. Temos exemplos que comprovam como o obsceno, a transgressão e a imoralidade são apagadas da nossa memória quando quem os cometeu nos bafejam com a virtude da Atracção Fatal. Vejam o exemplo do Jeremy Meeks, o mulato de olhos verdes que foi preso durante 2 anos por assalto à mão-armada. No dia em que a polícia o prendeu também partilhou a foto dele no Facebook (americanices), fomentando uma viralidade fora de série, em que não foram poupados os piropos atrevidos do mulherio do mundo inteiro. Todo este tumulto valeu-lhe o epíteto de hot felon (criminoso fogoso) e posteriormente ganhou vários contratos na indústria da moda, várias capas de revista, vários desfiles e até um namoro com a herdeira do império Arcadia, que detém a Topshop, abandonando um casamento de 10 anos com a mãe dos seus filhos. E assim se passou de bandido a santo, e nem foi preciso um Pai-Nosso para o perdão que o salvaria daquela vida indecorosa que levava.
Também perdoámos a Kate Moss depois de sabermos do consumo excessivo de cocaína e de toda a má conduta em orgias e álcool, tendo perdido contratos milionários com a Chanel, com a Burberry e com a H&M. Pessoas bonitas têm o poder do encantamento. E nós, comuns mortais, não resistimos àquele magnetismo hipnotizante.
E vamos falar da Kim Kardashian? Todo um império nasceu a partir da porn tape que protagonizou. Mas tudo escalou de nível quando o namoro com o Kanye West lhe deu um banho de bom-gosto. Foi quando oficialmente o mundo reformulou o padrão de beleza feminino, passando novamente a apreciar curvas generosas, o que já não acontecia desde… o Renascimento? Depois disso, já toda a família enriqueceu com negócios na indústria da Beleza, seja com linhas de maquilhagem, seja com programas de tv a mudar os hábitos de alimentação e exercício físico, seja a desfilar e a fotografar para campanhas das maiores casas de Alta-Costura. A Beleza deu-lhes o poder e o momento em que o pai se tornou numa linda mulher foi tão banalizado, que só serviu para provar como foram capazes de mudar mentalidades conservadoras ao fazer o mundo respeitar alguém que decide mudar de sexo.
Quanto a mim, tive a sorte de nascer com uns olhos que são sempre cobiçados onde quer que vá. Numa esfera mais íntima, acho que o resto de mim também está digno de se "comer”. Nunca impus ao mundo um estatuto, mas parece que o mundo me deu sinais (que não dá a todos) que posso entrar numa sala sem medos, de cabeça erguida e que posso pedir um café com sabor a coca-cola e que esse pedido não me seria nem negado nem questionado. Isto é nos dias bons, claro. Naqueles dias em que me sinto com a auto-estima lá em cima. Nos outros dias, só os olhares insinuantes que recebo é que me dão alguma confiança, a qual (deixem-me deixar isto claro) não depende exclusivamente de estímulos exteriores. A verdadeira confiança, a tal que exerce o verdadeiro poder, nasce das relações que vamos criando à medida que crescemos, com os nossos pais, com a família e depois com os amigos e todos os outros desconhecidos. Uma carinha laroca ajuda muito no primeiro contacto a fazer uma amizade, mas o que perdura na nossa memória é o sentimento de amor que recebemos dos outros. Primeiro dos pais (que é essencial) e depois dos outros. Quem não conhecer esse sentimento, por mais bem cotado que seja o seu lugar no ranking de Beleza, jamais conhecerá o verdadeiro prazer de aparecer num lugar e ser BAM! Porque até para aparecer num lugar e querer fazer BAM - com uma arma na mão - é preciso ter alguma dose de confiança! E mesmo tendo sido agraciado com a virtude da proporção e da simetria, não se pode ir assaltar um banco como se nada fosse. Se é para fazer, é para fazer em grande e bem feito. Com os sapatos certos, com a roupa bem escolhida e com a rotina matinal de beleza e de ginásio completa. O cabelo deverá estar no sítio certo e sem esquecer o protector solar com cor para atenuar as imperfeições na pele e esta ficar uniforme. Porque é assim que um banco fica bem assaltado. Porque é assim que as pessoas gostam de nós a assaltar bancos. Porque, a primeira impressão é que conta e nunca se sabe que boas oportunidades virão desse assalto!
Matias, “para ser grande sê inteiro”. Pessoa dixit. E eu acrescento: Dos pés à cabeça, em Adidas ou em Off-White!
Bruno Reis, colaborador da Miranda, é o fundador e diretor criativo da Teeorema, marca de luxo de T-shirts.
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