A sustentabilidade está na ordem do dia. Mas o que é a sustentabilidade? Como podemos nós, como consumidores, saber que estamos a comprar um produto sustentável sem cair no greenwashing?
Ainda não há definição formal para cosmético sustentável. A sustentabilidade é uma característica de modelo de desenvolvimento económico que visa o bem-estar da população atual sem comprometer as gerações futuras, e isso passa pela preservação do planeta. A sustentabilidade é uma longa viagem e engloba várias dimensões: ambiental, social e económica. Não pode comprometer a qualidade nem o desempenho do produto final, e sem segurança não existe sustentabilidade.
Ao longo do ciclo de vida de um cosmético, em todas as fases, há impacto na sustentabilidade: da seleção dos ingredientes à produção do produto, passando pela embalagem ou a distribuição, terminando na eliminação dos resíduos.
O mercado de produtos sustentáveis tem crescido exponencialmente nos últimos anos como uma resposta às preferências do consumidor. De acordo com dados publicados pelo Institute for Business Value, 6 em 10 consumidores estão dispostos a mudar os seus hábitos de compra para reduzir o impacto ambiental, e 8 em cada 10 indicam que a sustentabilidade é importante para eles. De entre aqueles que referem a sustentabilidade como muito ou extremamente importante, mais de 70% pagariam em média mais 35% por marcas que são sustentáveis e ambientalmente responsáveis, com 57% dos Gen Z e Millennials a afirmar que deixam de comprar produtos de marcas que consideram sem ética.
Para alcançar um estado mais sustentável, a indústria cosmética deve continuar a sua viagem para garantir a funcionalidade dos seus produtos, incorporando ingredientes mais ecológicos, processos e embalagens mais verdes, não esquecendo de influenciar o padrão de consumo e não apenas a produção. O futuro dos cosméticos depende de abordagens mais sustentáveis e, embora uma revolução não aconteça da noite para o dia, cada esforço em direção à sustentabilidade é um grande passo para um futuro melhor.
Guia simplificado para a escolha de cosméticos mais sustentáveis
Fórmulas sem água: a água é o recurso mais valioso que temos e no futuro será ainda mais, devido à sua escassez. Se pudermos trocar um sabonete, champô ou condicionador líquido, por um sólido, estamos ativamente a ser sustentáveis. O sabonete líquido, por exemplo, é muito menos eficiente do ponto de vista energético e de consumo de água. Precisa de 5x mais energia para ser produzido, 2-3x mais energia no transporte, consome mais 30% de água e é 7x mais usado, gastando-se mais depressa.
Ainda não existem fórmulas totalmente waterless. Quanto mais não seja na lavagem dos materiais de laboratório, a água fará parte do processo, mas ao remover completamente a água das fórmulas, estamos a poupá-la e também alteramos a necessidade de determinados conservantes, criando fórmulas mais simples e potencialmente melhor toleradas pelas peles mais sensíveis.
Origem dos ingredientes: geralmente é considerado que todos os ingredientes sintéticos são insustentáveis, e que todos os ingredientes de base natural são sustentáveis, o que nem sempre é verdade. Sustentável não é sinónimo de natural. Por exemplo, o óleo de palma e a mica, que são matérias-primas de fontes naturais, levantam várias questões de sustentabilidade. O mesmo para alguns óleos essenciais, porque geralmente são precisas grandes quantidades da planta para se obter 1 ml de óleo.
As embalagens e o seu destino pós-uso: as embalagens servem para proteger a formulação. Os principais aspetos a considerar relativamente à sustentabilidade das embalagens são o tipo de materiais utilizados, o número de camadas e a comunicação feita pelas marcas de modo a encorajarem boas práticas de reutilização ou descarte.
A maior parte dos produtos cosméticos que utilizamos na nossa rotina encontra-se num recipiente de plástico. É um facto que o plástico só acaba nos oceanos por nossa culpa, mas a verdade é que a sua produção consome muitos recursos e há alternativas mais ecológicas: 99% do plástico é derivado de petroquímicos, 40% é de uso único e menos de 10% é reciclado.
Neste capítulo das embalagens, as marcas têm o dever de ensinar o consumidor a descartar os diferentes materiais. É mais simples tratar uma embalagem monomaterial e algumas embalagens podem ter uma segunda vida: as embalagens de vidro (reciclado, de preferência) podem servir para guardar pincéis de maquilhagem, ou como guarda-joias, por exemplo.
Embalagens à base de materiais biodegradáveis ou compostáveis são cada vez mais uma tendência, pois permitem uma reciclagem natural sem necessidade de mais recursos. Há ainda a tendência para a ausência de folheto interior, para o refill e os programas de reciclagem. Nos papéis devemos escolher os que têm certificado FSC (Forest Stewardship Council) e nas tintas de impressão, tintas naturais — de soja, por exemplo. Todas estas informações são comunicadas pelas marcas.
Multifuncionalidade: o mesmo produto pode ter mais do que uma função. Um gel de duche pode ser um champô. Um condicionador pode ser uma máscara. Alguns óleos de rosto podem ser também aplicados no corpo ou no cabelo.
Evitar produtos supérfluos: será que precisamos de tudo o que temos na nossa rotina? Não estaremos a usar produtos com funções sobreponíveis? Um tónico, uma essência, uma água floral? Pensar antes de comprar é essencial. Ser sustentável é, acima de tudo, consumir com consciência, priorizar as nossas escolhas, não ceder à tentação de comprar por impulso e perceber que os resíduos de tudo o que temos permanecem por cá e serão sempre a nossa pegada.
Utensílios reutilizáveis: preferir alternativas antidesperdício aos descartáveis, tais como cotonetes e discos de limpeza reutilizáveis.
Por uma questão de coerência, os cosméticos refletem o nosso estilo de vida e até a nossa personalidade. Duas noções essenciais quando falamos em sustentabilidade na cosmética:
- comprar o que vamos usar
- analisar o período após abertura, que deverá sempre ser cumprido.
Ser sustentável é não ser consumista.
Descubra a playlist no Spotify dedicada ao nosso planeta.
Farmacêutica de formação e especialista em Cosmética, Joana Nobre trabalha na Indústria Farmacêutica desde 2005. O rigor é a sua imagem de marca, algo bem patente nesta nova rubrica que criou para a Miranda, que incluirá sempre a versão áudio do texto e uma playlist de Spotify criada também por ela, alusiva com o tema.
Para a realização deste artigo foram consultadas diversas fontes bibliográficas, tais como:
- Meet the 2020 Consumers Driving Change.; 2020.
- Culliney K. Earth Day 2021: A circular snapshot and look at beauty’s future. Cosmetics Design Europe. Published 2021. https://www.cosmeticsdesign-europe.com/Article/2021/04/22/Earth-Day-2021-CosmeticsDesign-Europe-circular-sustainable-beauty-snapshot-and-brainstorm
- Bom S, Jorge J, Ribeiro HM, Marto J. A step forward on sustainability in the cosmetics industry: A review. J Clean Prod. 2019;225. doi:10.1016/j.jclepro.2019.03.255
- Bom S, Ribeiro HM, Marto J. Sustainability calculator: A tool to assess sustainability in cosmetic products. Sustainability. 2020;12(4):1-15. doi:10.3390/su12041437
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