Desde criança que tenho uma relação especial com os meus olhos. Estes dois berlindes, sempre cobiçados pela família e pelos amigos, além da cor azul esverdeada, parece que também sempre foram muito bem emoldurados. Mas mais do que definir a minha vaidade, eles definiram um rumo de vida, sendo as esponjas de todas as minhas referências visuais, importantes agora no meu trabalho criativo. Deram-me uma primeira tristeza aos 32 anos, quando ganhei uma alergia às lentes de contacto e me vi obrigado a usar óculos, mas a novidade de um look hipster atenuou a coisa. Agora a tristeza escalara de nível: uma capacidade deficiente destes dois amigos se defenderem em situações traumáticas.

Descobri que o melhor teste ao estado da nossa pele aos 35 anos é experimentar algo radical como passar a noite toda a trabalhar no duro até às 8h30 da manhã, deitar-se finalmente às 10h e dormir duas horas para se reunir às 15h. Em situações destas, em que nos reunimos e queremos fazer boa figura, empatia e um sorriso generoso são os melhores trunfos para se transmitir uma óptima imagem. Mas aquele momento em que saí triunfante da dita reunião, em que entrei no elevador e me vi no reflexo do espelho, foi também derrotador. Pela primeira vez na minha vida, a idade ganhou um significado claríssimo sob a forma de duas batatas assadas monstras que tinha no lugar dos olhos. Dali para a frente nada mais seria igual ao que já foi, mas era imperativo pôr em prática um plano de emergência e reparar todos aqueles estragos.

Nos dias seguintes, quando tocava nos papos dos olhos, sentia a pele densa, seca e flácida. Já tinha começado a usar um creme para os olhos e este episódio coincidiu com o momento em que o mesmo tinha acabado. Até pensei para comigo que estava a ser vítima do capitalismo da indústria da cosmética, pois tamanha era a coincidência de ficar naquele estado assim que me vi sem o dito creme. Mas, analisando bem, já andava com alguma sobrecarga de trabalho, de stress e de noites mal dormidas. Estavam, portanto, criadas as condições ideais para uma crise epidérmica. Procurei, dali em diante, recuperar algum do sono, pelo menos no fim-de-semana, já que ainda estava com algum trabalho e durante a semana era impossível. Troquei a ‘bica’ pela versão sem cafeína, para poder mergulhar num descanso absoluto na hora de dormir. As idas à farmácia também passaram a ser mais frequentes.

A pomada... que deu em nada

Já tinha visto na internet o truque de usar pomada para hemorróidas contra as olheiras e um dia em conversa com um amigo tocámos no assunto e já não me senti isolado naquele tema. Eu tinha dado com duas marcas e ele referiu que a indicada era uma dessas, a Prepararion H. Lá fui à farmácia, com a fotografia da embalagem gravada no telemóvel. Mas, aparentemente, em Portugal, só há uma que se chama Preparação H e o rótulo é ligeiramente diferente. Nem é da mesma casa farmacêutica. Fiquei a balbuciar a minha dúvida até que a minha interlocutora disse: “O que o senhor quer é Faktu. É a que usam as top models.” A maneira como o disse foi tão assertiva que me encheu de esperança. Até senti que existia um clube secreto das top models e que ao comprar aquela pomada tinha ganho acesso a esse grupo tão exclusivo e restrito. E depois deste segredo, muitos mais me seriam revelados. Numa ida à farmácia, anterior a este ritual iniciático, também dei por mim a levar para casa uma pequena ampola de ácido hialurónico. Foi na farmácia da Foz, no Porto, onde ao entrar imediatamente perdi a coragem de pedir uma pomada destas.

Quem os viu e quem os vê

Bom, perdi a coragem mas não perdi a postura e o meu olhar de lince ainda vislumbrou um frasco cheio de ampolas de ácido hialurónico à venda por € 3 / cada. Não iria para casa de mãos a abanar e sem maneira de fazer frente ao problema. A ampola gastou-se em 3 dias e funcionou como um boost extra de vitalidade. Em relação à referida pomada, o processo seria mais longo. Usei-a de noite, tirei fotografias todos o dias, de manhã, e confesso que só acho que melhoraram porque a luz mais branca com que tenho tirado as ditas fotografias também tem melhorado.

De pronto-socorro à rotina que se impõe

Ainda noto algum inchaço (normal, quando se acorda, não?) e a zona das pálpebras junto às pestanas ainda está um pouco escura. Desconfio que só vai melhorar finalmente quando acabar esta fase de trabalho e conseguir dormir tudo o que preciso durante uma semana. Em relação à flacidez e às rugas, tudo melhorou quando retomei ao meu creme de sempre. “De sempre” é uma maneira de dizer, porque antes só tinha usado uma bisnaga - e é por isso que é legítima aquela minha referida desconfiança para com a indústria. Chama-se Q10 e custa € 2,49 e vende-se nos supermercados LIDL.

quem os viu e quem os vê
Cien anti-rugas

A marca - Cien - foi até a preferida dos consumidores espanhóis em 2014. Após sete dias de uso da pomada milagrosa os meus olhos acordaram num estado de obesidade mórbida. Isto aconteceu duas manhãs depois de uma saída à noite em que me deitei às 4h da manhã e acordei às 10h no dia seguinte.

quem os viu e quem os vê
Ureadin 10, loção hidratante

Nesse dia, quando fui aplicar o Q10 senti um ardor aflitivo em que tive de imediatamente passar para um plano B. Vasculhei a gaveta de cremes que nunca uso e encontrei uma amostra de ISDIN à base de ureia. Soube instintivamente que aquilo poderia acalmar a pele e foi mesmo remédio santo! Ainda o usei durante três dias, até que voltei ao Q10, tendo parado com a malfadada pomada. Nos dias seguintes, ainda experimentei duas sessões de sacos de chá preto encharcados e outras duas de rodelas de pepino (básico, não?)

Um mês e meio depois do episódio revelador, o aspecto dos olhos está francamente melhor, com papos pouco evidentes e apenas uma linha arroxeada nas pálpebras muito ténue, no contorno das pestanas. Ainda não estou 100% satisfeito, mas a idade não volta atrás e vou ter de me habituar à ideia de que daqui para a frente tudo o que fizer para revitalizar estes meus companheiros irá apenas retardar um envelhecimento inevitável. E cada pequena acção que antes era só um pronto-socorro, hoje deve ser tomada como uma rotina.

Bruno Reis, colaborador da Miranda, é o fundador e director criativo da Teeorema, marca de luxo de t-shirts.