
Enquanto médica especializada em medicina funcional e modulação hormonal, uma das queixas mais frequentes que recebo no consultório é a diminuição do desejo sexual e a dificuldade em atingir o orgasmo. São mulheres informadas, muitas com carreiras exigentes e vidas estruturadas, mas que chegam até mim a relatar um profundo afastamento da sua sexualidade.
“Será que já não gosto do meu marido?”, “Será da rotina?”, “A culpa é dos meus filhos que invadiram o nosso quarto!”.
A resposta, na maioria das vezes, não está apenas em fatores emocionais ou relacionais. Está no desequilíbrio hormonal.
E entre as hormonas mais negligenciadas na saúde feminina está a testosterona.
Testosterona: uma hormona feminina também
Embora socialmente associada aos homens, a testosterona é fundamental para o organismo da mulher. É produzida principalmente nos ovários e, em menor grau, nas glândulas suprarrenais. Em equilíbrio, promove:
Libido e resposta sexual;
Capacidade de atingir o orgasmo;
Tónus muscular e força física;
Clareza mental e motivação;
Estabilidade emocional.
No entanto, a partir dos 35 anos, ou mesmo antes, em situações de stress crónico, uso prolongado de contraceptivos ou disfunção ovárica, os níveis de testosterona podem começar a cair de forma significativa.
"Sem suporte hormonal adequado, o corpo pode simplesmente não responder."
Dra. Andreia de Almeida
Sinais clínicos de défice de testosterona na mulher
Os sintomas mais comuns incluem:
Redução de massa muscular e aumento da gordura abdominal;
Fadiga persistente, mesmo após descanso;
Diminuição ou ausência de libido;
Dificuldade em atingir o orgasmo (ou orgasmos menos intensos);
Irritabilidade, apatia ou desmotivação;
Perda de foco e de clareza mental;
Secura vaginal (especialmente em mulheres na perimenopausa e menopausa).
Estes sintomas tendem a ser desvalorizados ou atribuídos ao envelhecimento, ao stress ou a “fases da vida”, o que atrasa o diagnóstico e agrava o impacto na qualidade de vida da mulher.
Como testar se tem défice de testosterona?
Na prática clínica funcional, os exames laboratoriais devem ser feitos de forma estratégica. Idealmente, recomenda-se:
Testosterona total;
Testosterona livre;
SHBG (Globulina de Ligação à Hormona Sexual);
DHEA-S (precursora de androgénios produzida nas suprarrenais);
Opcional: cortisol, estrogénios, progesterona e TSH, para uma visão global.
A testosterona total, isoladamente, nem sempre reflete o verdadeiro estado hormonal da paciente. Muitas mulheres apresentam níveis "normais" de testosterona total, mas níveis baixos de testosterona livre, devido a uma SHBG elevada (comum em mulheres que tomam a pílula, por exemplo). É a testosterona livre que tem ação biológica real nos tecidos.
Como corrigir: iniciar a modulação com testosterona bioidêntica
Quando o défice é confirmado clínica e laboratorialmente, pode ser indicada a reposição com testosterona bioidêntica, de forma individualizada. Trata-se de uma substância molecularmente idêntica à produzida pelo organismo humano, com segurança e eficácia comprovadas, desde que corretamente prescrita.
A forma mais utilizada pode ser um gel ou creme transdérmico diário, aplicado na pele (braços ou outras zonas sem pêlo), com uma dose ajustada às necessidades de cada paciente. Importa sublinhar que a testosterona não deve ser prescrita sem avaliação prévia e acompanhamento regular, devido ao risco de efeitos adversos (acne, aumento de pêlos, alterações hepáticas, entre outros, quando mal doseada).
Com uma dose bem ajustada, a grande maioria das mulheres experimenta:
Recuperação do desejo sexual;
Aumento da resposta ao estímulo e da capacidade em atingir o orgasmo;
Sensação de “voltar a si mesma”;
Melhoria do humor, energia e motivação;
Redução da gordura abdominal e melhoria da composição corporal.
Casos especiais: mulheres na menopausa
Durante a menopausa, a produção de todas as hormonas sexuais diminui drasticamente. É comum que, além da testosterona, haja défice de estrogénio e progesterona. Nestes casos, a modulação hormonal combinada (com outras hormonas bioidênticas) pode ser indicada para restaurar o equilíbrio integral da mulher.
Testemunhos clínicos mostram que muitas mulheres na menopausa que repõem testosterona adequadamente experimentam um renascimento sexual e emocional, que impacta positivamente nas suas relações com os parceiros e aumenta a autoestima e o bem-estar.
Libido e orgasmo: mais do que uma questão psicológica
É importante deixar claro que a sexualidade feminina é multifatorial. O estado emocional, a qualidade da relação, o contexto de vida e a imagem corporal influenciam, sim. No entanto, sem suporte hormonal adequado, o corpo pode simplesmente não responder.
Mulheres emocionalmente bem resolvidas, com vidas estáveis e relações afetivas saudáveis, podem experienciar frustração profunda por não conseguirem ter desejo nem prazer. Nestes casos, o foco apenas em terapia ou “trabalho emocional” falha, e a mulher permanece desconectada do seu corpo.
E como não adivinhamos, o importante é avaliar cada caso.
Como médica, vejo a testosterona não como uma solução mágica, mas como uma parte essencial da saúde da mulher moderna. O nosso estilo de vida atual, com tanto stress crónico, má alimentação, sedentarismo diário e até a poluição hormonal (comecem a ler os rótulos do que comem e como isso impacta as nossas hormonas), favorece um desequilíbrio endócrino. E é fundamental olhar para o corpo com profundidade, respeitando a sua complexidade.
Para mim, a libido sexual é um sinal de vitalidade.
A dificuldade em atingir o orgasmo não é uma falha sua.
É um sinal de que o corpo precisa de atenção.
Se se identifica com o que leu, procure um profissional qualificado para investigar o seu caso de forma funcional, integrativa e respeitosa.
Porque o prazer também é saúde. E saúde é poder.
A Dra Andreia de Almeida, é médica certificada em Medicina Funcional e Medicina Anti-Aging, com treino especializado em Modulação Hormonal e suplementação avançada. Conhecida pela sua abordagem empoderadora e focada na pessoa, através da sua prática clínica procura inspirar as pessoas a encontrarem o equilíbrio, bem-estar e felicidade interior. Escreveu o livro “Saúde para ELAS: o kit de sobrevivência para mulheres dos 20 aos 60+”, um livro dedicado à saúde feminina.
Comentários