Privada de fazer a vida normal – entenda-se, como a conhecíamos pré-COVID – continuo fechada em casa, em teletrabalho, com a sucessão dos dias a um ritmo infernal, mas todos idênticos na sua ausência de contactos sociais, de locais, cheiros ou pessoas que os distingam e enriqueçam.

Passo horas sentada à secretária e a minha pouca ligação com o mundo exterior faz-se através do computador e do telefone. Ao fim de mais de um ano a este ritmo, sinto uma enorme desmotivação que não me larga, dificuldade de concentração e uma ligeira ausência de esperança no futuro.

Não se trata de depressão, nem de burnout, mas é como se os dias se salpicassem de um nevoeiro contínuo, mesmo que estejamos na primavera. Uma espécie de alegria em "pause" e que no seu lugar se tivesse instalado uma sensação de vazio.

#ÀFlorDaPele: a espuma dos dias
créditos: Kinga Cichewicz/Unsplash
Sinto-me definhar.

Quando, em 2020, passámos o 25 de Abril confinados em casa, estávamos longe de imaginar que em 2021 continuaríamos a viver uma situação idêntica. Mesmo que este ano tenhamos tido mais liberdade que no ano anterior, a verdade é que a vida mudou, o mundo mudou, e continuamos limitados nas nossas ações, na forma como interagimos com os outros e como nos fechamos, cada vez mais em nós mesmos, ausentes de tudo aquilo que nos acrescentava.

E isso muda-nos.

Este sentimento desolador provoca-nos uma série de sintomas e sensações menos positivas, e marca o ano de 2021. Um ano em que já há vacinas, mas ainda não chegam a todos; em que voltámos a ficar em casa para nossa proteção individual e bem comum; em que voltámos a fechar fronteiras e o comércio; em que continuamos em teletrabalho – sujeitos a longas horas de trabalho remoto e reuniões por zoom. Vivemos através de ecrãs, seja para falar com a família ou com os colegas de trabalho, e todos os dias morremos mais um bocadinho por dentro.

Aparentemente não temos sinais de doença mental, pois continuamos a cumprir as nossas obrigações, a trabalhar, a produzir, mas não nos encontramos a funcionar a 100%. Há uma falta de motivação constante, um sentimento de languidez e uma dificuldade de concentração que atrapalha o nosso rendimento – seja ele escolar ou profissional.

E este parece ser o sentimento dominante em 2021. Em inglês dá pelo nome de 'languishing' – e aparece como "o filho do meio" da saúde mental. Não é depressão, também não é exaustão, é um definhar fininho e constante, que se entranhou nas nossas vidas e que nos habituámos a suportar, resignados.

Se por um lado os sintomas físicos que a COVID provoca já são conhecidos dos médicos e estudados pelos cientistas, como tratar das mazelas emocionais que esta pandemia interminável provoca?

#ÀFlorDaPele: boas energias precisam-se
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Traduzido à letra para português, o languishing, ou o sentimento de “definhar”, é, segundo o dicionário de língua portuguesa, um “enfraquecer-se gradualmente, extenuar-se, murchar, decair” – e no imediato, identifico-me com todos os sinónimos, incluindo-me nesse vazio da doença mental que não é considerada preocupante mas que mexe com o meu bem-estar, que não é grave como uma depressão, mas que pode ser também ele fator desencadeador de doenças.

Acredito que não seja a única a sentir-me entorpecida e dormente após mais de um ano de pandemia porque, na verdade, não sabemos muito bem quando é que isto acaba, como se tivéssemos todos sido postos de castigo sem ter um fim visível à vista. Mas enquanto tudo não termina, tenho-me socorrido de pequenos truques para encontrar a motivação que por vezes me falha:

  • meditação matinal, que me ajuda a começar o dia com outra energia, enchendo-me de afirmações positivas e tendo cada vez mais consciência da importância da qualidade dos nossos pensamentos e da conexão entre corpo e mente;
  • pequenos passeios higiénicos à hora de almoço, que sempre me obrigam a mexer as pernas – já que passo horas e horas sentada, limitando-me a pequenos circuitos que alternam entre sala, casa de banho e cozinha;
  • contacto com a natureza ao fim-de-semana e longas caminhadas que me enchem de endorfinas e de bem-estar, já que o estar fechada o dia inteiro em casa me priva de sentir o mundo lá fora e me desliga do que, supostamente, antes me recarregava baterias;
  • aproveitar a energia D – que nos enche, naturalmente, de minerais como o zinco, o selénio, o magnésio, que nos fortalecem o sistema imunitário;
  • e do bom que é ter um animal de estimação que nos proporciona companhia e amor incondicional, além de nos encher de alegria.

Eu até me posso sentir “enfraquecida gradualmente, extenuada, murcha, decaída”, mas recuso-me a definhar. E esse será o meu objetivo dominante para 2021.

Mafalda Santos  fez das palavras profissão, tendo passado pelo jornalismo, assessoria de imprensa, marketing e media relations. Acredita em quebrar tabus e na educação para a diferença, temas que aborda duas vezes por mês, na Miranda, em #ÀFlorDaPele.