Por me encontrar comprometida há tanto tempo e indisponível para o que são as dinâmicas que uma pessoa solteira tem de enfrentar atualmente para conseguir conhecer novas pessoas e envolver-se romântica ou sexualmente, a minha ideia de encontro com alguém por quem tenha algum tipo de atração e que me cative emocionalmente ainda passa muito pelo cenário de sair para jantar ou tomar um café e uma boa conversa.

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Não vou ser hipócrita e dizer que os olhos não comem, que não tem de haver ali um clique de atração física que me desperte o desejo ou que me chame a atenção – um pormenor, um cheiro, algo que considere atraente – mas se a conversa não me cativar, nada feito. Também não vou negar que mesmo nos meus tempos de solteira, e ainda não havendo aplicações como o Tinder, ou redes sociais como o WhatsApp, a troca de SMS era uma constante com alguém por quem estávamos emocionalmente interessadas, mas não havia swipe para a direita ou para a esquerda e baseados numa fotografia, como se estivéssemos na montra do talho. Esforçávamo-nos para conhecer pessoas, fosse numa saída à noite, no ginásio, ou através de amigos dos amigos. Se era fácil? Claro que não, mas olhando à luz atual, era tudo mais artesanal e, como tal, também tinha o seu ‘quê’ de romântico. Nunca sabíamos se o número que nos tinham escrito no pedaço de papel manhoso que conseguimos na noite e com a caneta que o barman nos emprestou para o efeito, era o correto.

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créditos: Annie Spratt / Unsplash

Personagens como Carrie Bradshaw, da série 'O Sexo e a Cidade', e as suas aventuras amorosas em Nova Iorque, eram a nossa referência. Os telemóveis e os computadores não dominavam a nossa vida e quem era solteiro tinha a vida mais dificultada no que diz respeito a oportunidades de conhecer pessoas novas e diferentes que fossem ao encontro dos seus interesses. Agora basta dar um toque com o telemóvel, ou procurar o perfil no Instagram e voilà, a magia acontece.

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créditos: Pratik Gupta / Unsplash

Por isso, quando esta semana li a notícia de que há uma nova geração – a Z – que procura essa autenticidade nos encontros amorosos, preferindo conhecer primeiramente a pessoa antes de se envolver sexualmente com a mesma, e privilegiando o diálogo e a amizade, sorri. Mas ao mesmo tempo senti-me bastante datada porque, na realidade, nunca vivenciei outra forma de conhecer pessoas por quem tivesse interesse. Claro que também tenho a minha quota parte de histórias e encontros menos felizes de pessoas que, inicialmente, pareciam ser muito promissoras e que se revelaram um fracasso, mas o prazer de ir conhecendo alguém aos poucos é mesmo esse: a expectativa de conhecer o outro, de nos sentirmos envolvidos e cada vez mais atraídos pelo mesmo. Ou, pelo contrário, a desilusão que é constatar, após dois jantares, que afinal o Zé Paulo que conhecemos na Ladies Night do Docks da 24 de julho, à luz do dia e com menos duas vodkas com laranja, perdeu o encanto.

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Atualmente – e assistindo-se a um revivalismo quase “vintage” – a tendência para conhecer pessoas na vida real, fora do acesso a apps de encontros, parece estar a ganhar preferência entre as novas gerações que, após os anos de pandemia e de vida intensamente online, estão a trocar o ecrã por relações sociais reais. Tal como na moda, constato que até as relações amorosas são revivalistas. Assim como o vinil voltou a estar na moda – se é que alguma vez deixou de estar – afinal, um clássico é sempre um clássico, questiono: alguma vez as relações sociais deixaram de estar na moda, ou foi apenas uma tendência? Não será a empatia, o sorriso e o humor, os pontos e interesses em comum, os valores e a admiração, aquilo que devemos considerar como a base para qualquer relação, seja ela amorosa, pessoal ou, até, de trabalho? E o tempo que lhe dedicamos não deverá também ele entrar na linha de requisitos? É que, convenhamos, todos sabemos que comer fast food uma vez ou outra até pode dar jeito, saber bem e desenrascar, mas nada bate uma boa comida caseira. Passando o eufemismo.

Não se admirem se a seguir recomeçarmos a escrever cartas. Isso sim, é o epíteto último do romantismo.

Mafalda Santos fez das palavras profissão, tendo passado pelo jornalismo, assessoria de imprensa, marketing e media relations. Acredita em quebrar tabus e na educação para a diferença, temas que aborda duas vezes por mês, na Miranda, em #ÀFlorDaPele.